REFLEXOS

REFLEXOS

O processo de treino coloca-nos de forma sistemática confrontados com “reflexos” que não são mais do que bons ou maus resultados de práticas bem ou mal sucedidas.

Um dos maiores problemas no processo de treino é perdermos demasiado tempo nas “imagens reflectidas”, esperando alterar algo que só é possível, se alterarmos a origem desses “reflexos”. A verdade, é que frequentemente perdemos demasiado tempo com estes “reflexos”, como se ficássemos encadeados ou encantados, procurando alterar variáveis que não são alteráveis, se perdermos a noção do ponto de partida dessas “imagens”.

Por vezes, queremos tanto mexer em algo, que só criamos mais confusão, agitamos esses “reflexos” e pouco ou nada conseguimos alterar na “imagem original”.

Falamos disto, porque este é claramente um fator que nos preocupa no processo de treino de corredores. Sejamos mais claros:

1. Reflexo – Níveis de resistência

Quantas vezes perante a vontade de aumentarmos os níveis de resistência aeróbia, aumentamos os volumes de treino, perdendo totalmente a noção de que os volumes podem estar adequados e o que pode estar errado é a falta de treino em áreas tão vitais, como a resistências muscular, a técnica de corrida ou força explosiva dos corredores?

 O que alterar na origem?

Alterar o tempo de apoio do corredor, desenvolver uma atitude técnica mais correta, aumentar a resistência muscular, para proporcionar ao corredor uma corrida tecnicamente mais sustentada ao longo do tempo de esforço.

2. Reflexo – Velocidade de corrida

Muitas vezes somos confrontados com a necessidade de adotar velocidades de corrida diferenciadas e alteramos o que não devíamos alterar… Não é correndo em métodos contínuos a alta intensidade que vamos evoluir. A tradicional “volta ao coreto”, cada vez mais rápida, não sustenta uma evolução desportiva do corredor. É preciso muito mais do que isso, sobre pena de que mais rápido pode ser pior performance.

 O que alterar na origem?

Tornar o corredor capaz de saber adotar diferentes velocidades de corrida. Os métodos contínuos, são importantes em determinados momentos e a velocidade de corrida tem de ser devidamente controlada. Os métodos intermitentes permitem sustentar velocidades mais elevadas por mais tempo e promover importante melhorias na potência aeróbia de um corredor. Misturar tudo isto e não saber discriminar quando correr mais rápido e quando correr mais lento é condenar a curto/médio prazo o corredor ao insucesso.

3. Reflexo – Má atitude técnica

É muito comum, vermos atletas com uma técnica de corrida profundamente atípica. Frequentemente com graves consequências de rendimento na corrida, estes problemas são muitas vezes abordados com indicações técnicas que incidem nas consequências finais desses erros técnicos e quase nunca na origem dos mesmos. Uma situação que quase sempre poucas ou nenhumas alterações produzem nesses erros…

O que alterar na origem?

Identificar a causa desses erros. Identificar o trabalho muscular que terá de ser realizado para que na origem possamos resolver esses problemas. É frequentemente mais fácil obtermos essas alterações à custa de um treino muscular intencional e cuidado que terá como consequência essas correcções em vez de feedbacks verbais constantes que frequentemente só colocam o praticante com a sensação de que simplesmente não sabe correr…

4. Reflexo – Lesões desportivas

As lesões desportivas fazem parte do dia-a-dia de muitos corredores. A forma mais fácil de resolver o problema é sempre encaminhar os corredores para o médico ou fisioterapeuta e simplesmente esperar que o regresso à corrida, seja feito sem reincidência da lesão! De fato, com intervenção médica podemos eliminar estados inflamatórios e retirar a dor ou edema. Mas estamos a resolver verdadeiramente o problema?…

 O que alterar na origem?

A lesão desportiva é quase sempre incompetência nossa! Quando dizemos nossa, podemos refererimo-nos a quem é responsável pela prescrição do treino. Quem prescreve treino e tem um atleta lesionado, tem de encontrar desde logo o potencial problema da lesão em erros do processo de treino! O treino até pode não ter potenciado a lesão, mas seguramente em muitos casos, o treino poderia ter reduzido ou eliminado a probabilidade da lesão desportiva. Corrermos o risco de termos atletas lesionados, como se a solução do problema estivesse nas mãos de outros e não de quem prescreve o treino, é desprovido de sentido e muito penalizante para os corredores. A melhor forma de provocar melhorias constantes no processo de treino e fazer com que os atletas se afirmem desportivamente ao longo do tempo, passa em grande medida pela não existência de lesões desportivas, que arruinam por completo todo o trabalho que durante meses ou anos se desenvolve com um determinado atleta.

5. Reflexo – Necessidade de vitaminas

É inacreditável a quantidade de corredores que pensam precisar de vitaminas porque se sentem mais fracos. Muitos recorrem aos seus médicos na esperança de encontrarem a vitamina ideal para lhe darem a força perdida… Outros acreditam que uma ingestão desmesurada e regular de suplementos ergogénicos lhes vai receber o problema! O curioso é que raramente encontramos praticantes que pensem que lhes falta algo de muito mais importante no seu treino que lhes permita obter esses níveis de força…

 O que alterar na origem?

É óbvio que esse investimento numa panóplia de vitaminas e suplementos pouco ou nenhum efeito terão na melhoria do rendimento na corrida. Para além disso, existem cada vez mais estudos que evidenciam mais prejuízos do que benefícios com a ingestão de determinadas vitaminas em doses até aqui consideradas importantes. Estamos claramente, a procurar alterar de forma errada um reflexo de diminuição de rendimento, sem alterarmos a origem desse problema que tem apenas haver com a ausência de sessões bem orientadas de reforço muscular… Mas porque razão haveria de ser a falta de vitamínas?

6. Reflexo – Correr mais para ser mais saudável

O crescimento da corrida tem também levado muitos praticantes a considerarem que quanto mais correrem, melhor saúde terão! De fato a corrida pode ser fortemente promotora de um nível de saúde melhorado e de um crescimento da longevidade dos seus praticantes, associado a uma melhor qualidade de vida com muito maior independência. Os benefícios são enormes e bem estudados. Mas quantos acreditando nesta relação entre volume de corrida e saúde não estarão a poder comprometer a sua própria saúde?

O que alterar na origem?

O treino aeróbio durante um determinado período de tempo é decisivo para um bom nível de saúde. Mas não é tudo! É importante preservar um boa estrutura muscular, uma capacidade de recrutamento das fibras rápidas, ter uma boa capacidade de equilíbrio e resistência muscular. A saúde não advém da destruição de algumas capacidades físicas em detrimento apenas de uma melhoria desenfreada do sistema aeróbio… A diversidade de conteúdos e enriquecimento de estímulos no treino, fará com que em cada corredor esteja de fato um praticante cada vez mais saudável e responsável na sua prática.

7. Reflexo – Encarar o treino com máximo rigor e seriedade

Somos diariamente invadidos por mensagens em sites e redes sociais, sobre a importância do máximo rigor e sacrifício para se obterem melhores níveis de rendimento. Muitos corredores adotam esta estratégia e divulgam-na como se isto fizesse do seu treino, um trabalho mais correto e mais eficaz, rumo a uma melhoria progressiva do rendimento desportivo.

 O que alterar na origem?

É frequente misturar-se rigor e seriedade no treino com atitudes obsessivas e prejudiciais para o rendimento, muitas vezes agravadas por estados emocionais que criam pressão e mau estar no processo de treino. A perda de divertimento no treino será um dos primeiros passos para o insucesso, pelo que, as mensagens de exigência para obtermos elevados níveis de rendimento deveriam ser substituídas por mensagens de inteligência! Deste modo, com a selecção das melhores estratégias de treino, poderá conseguir-se uma melhor adaptação às cargas de treino, que será tão mais elevada quanto melhor for o estado emocional e o divertimento que se tira do treino. Quem não entende isto, dificilmente poderá ser bom treinador!

8. Reflexo – Treinar, treinar, treinar…

Esta é a mensagem quase sempre adotada no processo de treino. Quanto mais se treinar, melhores serão os resultados, quanto mais rápido se correr melhor será? Quanto mais, quanto mais…

O que alterar na origem?

Porque não aprender, aprender, aprender? Porque não aprender a resistência e a força antes de as “treinar”? Porque não aprender que a resistência para ser melhorada deve ter pressupostos de aprendizagem de ritmos, de sensações técnicas, de preservação de variáveis mecânicas, antes de qualquer outro aspeto? Porque não entender que tanto a resistência, como a força, devem ser vistas como algo que se deve aprender a utilizar antes de as treinar, muita vezes baseando o treino apenas no somatório de volumes, de quilos ou de velocidades? Não será mais importante aprender a usar um músculo, mesmo que pequeno, do que procurar aumentar o músculo que não é recrutado da forma correta? Porquê inverter o processo e acreditarmos apenas no treino como uma espécie de contas de somar?

9. Reflexo – Rentabilizar todo o tempo possível para treinar

É muito comum vermos praticantes, que acreditam que o mais importante é utilizarem todo o tempo disponível para treinarem. Rentabilizando esse tempo de treino ao máximo, esperam melhorias significativas no seu rendimento.

 O que alterar na origem?

O problema é que “rentabilizar” todo o tempo livre, sem conseguir-se tempo para descansar, o treino pouco efeito positivo provocará! Na verdade, o treino funciona sempre como uma agressão que só tem efeitos positivos durante os períodos de repouso. Treino sem regeneração apenas corresponde a uma agressão que não irá provocar melhorias na capacidade de rendimento. É necessário saber respeitar as necessidades de um bom descanso, sobre pena de que por muito que se treine o resultado final será sempre desastroso e poderá comprometer a saúde de cada praticante.

Saber corrigir a origem dos problemas é o maior desafio de todos. Quando se vêm “reflexos” de erros e se tentam apenas corrigir essas “imagens”, podemos esconder temporariamente problemas, mas nunca os corrigimos de verdade! Se existem segredos no processo de treino, aqui está um deles!

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EXEMPLOS DO QUÉNIA

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